fonte: Expositor Cristão Março/2011
Por José Geraldo Magalhães e Diana Gilli
A violência contra a mulher existe há milhares de anos. Um dos primeiros relatos não foi registrado em nenhuma Delegacia da Mulher e muito menos em um Disque-Denúncia, por essa razão o criminoso ficou com o paradeiro ignorado. Mesmo assim, o crime ficou na história. Na ocasião, houve um caso de relação sexual forçada com uma mulher na cidade de Siquém, em Israel (Mundo Antigo). A vítima, Dina, foi assediada por um homem com o mesmo nome da cidade, Siquém. A história diz que “o homem viu Dina, pegou-a e a forçou a ter relações com ele”.
Se fosse no século XXI, de acordo com o Secretário Executivo da Igreja Metodista, Dr. Alexandre Rocha Maia, “Siquém deveria ser enquadrado no Artigo 213 do Código Penal em vigor podendo pegar uma pena de 6 a 10 anos de reclusão”, no entanto, o crime de estupro foi registrado por Moisés por volta de 1450 anos antes de Cristo no livro sagrado, a Bíblia.O desfecho você encontra em Gênesis 34.1-3. Na ocasião, o criminoso não foi detido.
Casos como esse acontecem a todo instante. Segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), que ouviu 2.770 mulheres nas cinco regiões do país no final do ano passado, casos devem ser apurados mesmo quando a vítima não quer. |
O resultado aponta que 81,9% da população concordam que a violência doméstica cometida contra mulheres é um grande desafio para a sociedade. De acordo com a pesquisa, 91% dos entrevistados defendem que haja uma investigação mais rígida e 78,6% consideram que a aplicação da Lei Maria da Penha, lei 13.340/2006 (a lei levou o nome da farmacêutica Maria da Penha Fernandes, que lutou pela condenação de seu agressor) pode diminuir a violência contra as mulheres. Em 2011 a lei completa cinco anos.
De onde vem a violência contra a mulher?
De acordo com a Cartilha da Violência Contra a Mulher, “a raiz da violência está marcada na sociedade porque esta ainda dá mais valor ao homem, o que por sua vez se reflete na forma de educar os meninos e as meninas. Enquanto os meninos são incentivados a valorizar a força física, a agressividade, ação, a dominação e a satisfazer seus desejos, inclusive os sexuais, as meninas são valorizadas pela delicadeza, beleza, submissão, sedução, sentimentalismo, dependência, passividade e o cuidado com os outros.
Na maioria dos casos de violência contra a mulher, ela é gerada por causa do uso de álcool, drogas e ciúmes”. Essa “violência contra a mulher afeta sua saúde, sua integridade física e pode levar facilmente ao assassinato”, afirma Eva Alterman Blay, Profa. Titular de Sociologia e Coordenadora Cientifica do NEMGE (Núcleo de Estudos da Mulher e Relações Sociais de Gênero) da Universidade Metodista de São Paulo (USP).
Medo
A Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Mulher, em Juiz de Fora, MG, registra uma média 500 ocorrências mensais e fica entre as cidades que apresentam índices mais altos ao se tratar de violência contra a mulher. Os números mais recentes mostram que, em agosto de 2010, foram 578 ocorrências e 476 no mês anterior do mesmo ano.
Para a delegada, Sônia Parma, os números ainda são baixos. "A mulher não vem à delegacia logo após a agressão, a nossa porta é a última que ela chega", diz. Sônia aponta ainda que existam três tipos de violência: a psicológica que acontece geralmente no convívio familiar; a física que é visível e deixa marcas no corpo, aliás, esta é considerada a mais comum, com lesões leves; e a social que é praticada no convívio da sociedade.
O teólogo, Rev. Marcos Garcia, que desenvolveu seu doutorado em Ciências Sociais e da Religião e pastor da Catedral Metodista de São Paulo, afirma ter “testemunhos de jovens que se recordam de serem molestados na infância, tocados até mesmo na sua comunidade de fé”.
Pais não quiseram denunciar
Nathalia C. de 28 anos vive em Montes Claros, Minas Gerais e já passou na pele um tipo de violência. Ela tinha apenas 12 anos quando seu tio tentou molestá-la ainda dormindo. Ao sentir alguém lhe acariciando nas partes íntimas gritou e imediatamente seus pais se levantaram. “Meus pais ficaram estarrecidos, o sentimento era de desprezo, ódio, vontade de sair batendo, fazer justiça com as próprias mãos”, lembra-se a jovem.
Mesmo assim, o caso não foi registrado em uma Delegacia, Nathalia e seus pais apenas cortaram o relacionamento familiar com o agressor.
Segundo Marcos Garcia, “muitas vezes a pessoa sofre o abuso e não tem coragem de denunciar. Em algumas situações ela não tem força para isso (...) quando falamos em denunciar sempre o que nos vem à mente é ter que tomar uma posição. Às vezes queremos ficar de bem com todo mundo” disse. O pastor afirma ainda que “o lar cristão deve ser a base. É preciso considerar esse como um espaço de crescimento e desenvolvimento de uma vivência saudável”.
“Tive que passar por muitos tratamentos terapêuticos. Foi nojento, aquilo sempre me vinha à mente e de alguma forma eu ainda me sentia culpada, sei lá, passa tudo na nossa cabeça em um momento desses”, desabafa Nathalia C.
A jovem diz que todo esse pesadelo acabou com sua adolescência e a fez mudar de cidade. “Eu já pensei em acabar com a minha vida, mas vi que não valeria a pena, hoje vivo bem, não esqueci o que aconteceu, mas vivo bem”.
Não é só o homem que violenta a mulher, muitas vezes são mulheres, só que de outra forma. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho – OITU, um dos casos que mais vem chamando atenção nos últimos anos é a questão do assédio moral, principalmente dentro do ambiente de trabalho. A violência moral é entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. Abaixo você pode ver os dados e sintomas apresentados em uma pesquisa realizada na PUC sobre a violência moral. Depois de um tapa nas costas e muitos insultos, Simone de Gouvêa Rosa, de 35 anos, recorreu à Justiça. Desde junho de 2007 briga por uma indenização. A acusação é de agressão moral e física por parte de sua chefia. Abalada, a funcionária diz que passou por um psiquiatra e uma psicóloga e teve de tratar da depressão com muitos remédios. “Tomava calmantes, não conseguia dormir. Naquela época não conseguia sair de casa, nem tirava o pijama, ficava enfiada no quarto o dia inteiro à base de antidepressivos, afirma.
O pastor e psicólogo Nils Friberg alerta para os prejuízos que o assédio moral causa. De acordo com ele, a violência moral contra a mulher se caracteriza por gestos, condutas abusivas e constrangedoras; ainda humilhar, inferiorizar, amedrontar, menosprezar ou desprezar, ironizar, difamar, ridicularizar, risinhos, suspiros, piadas jocosas relacionadas ao sexo, ser indiferente à presença do/a outro/a, estigmatizar os/as adoecidos/as pelo e para o trabalho, colocá-los/as em situações vexatórias, falar baixinho acerca da pessoa, olhar e não ver ou ignorar sua presença, entre outros.
De acordo com Diná Branchini, da Pastoral de Combate ao Racismo da Igreja Metodista, a mulher negra também sofre com o assédio. “Que ocorre, ocorre. Desde a questão estética, principalmente se ela mantém o cabelo mais natural, podem falar que não está bem arrumada. Já ouvi casos de pessoas que não estavam dentro do padrão estético”, afirma ela.
O assédio moral é tão antigo quanto o trabalho. É interessante lembrar que o primeiro assédio moral fruto de uma relação laboral se encontra na Bíblia, em Gênesis, capítulo 37, versículos: 3 a 24. José, filho de Jacó, foi vitima de assédio moral por parte dos irmãos, estes com ciúmes do amor do pai pelo irmão mais novo, tramaram sua morte, como não tiveram coragem de subtrair sua vida física, tentaram privá-lo da presença e do amor do pai. José era odiado pelos irmãos não somente, pelo fato de o pai amá-lo mais e sim, também, por ter mais responsabilidade e desempenhar melhor a tarefa que os demais.
O que pode ser feito?
- Procurar as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM), também chamadas de Delegacias da Mulher (DDM);
- Ir até os Juizados Especiais, nos Conselhos Estaduais dos Direitos das Mulheres, Defensorias Públicas e, em organizações de mulheres;
- Disque-Denúncia 180, um serviço específico para receber queixas de violência doméstica contra a mulher que, somente até meados do ano passado registrou alta de 112% se comparado ao mesmo período do ano anterior (2009);
- No caso de assédio moral no ambiente de trabalho é necessário denunciar o ocorrido ao Sindicato da classe trabalhadora ou no Ministério do Trabalho.
- Ir até os Juizados Especiais, nos Conselhos Estaduais dos Direitos das Mulheres, Defensorias Públicas e, em organizações de mulheres;
- Disque-Denúncia 180, um serviço específico para receber queixas de violência doméstica contra a mulher que, somente até meados do ano passado registrou alta de 112% se comparado ao mesmo período do ano anterior (2009);
- No caso de assédio moral no ambiente de trabalho é necessário denunciar o ocorrido ao Sindicato da classe trabalhadora ou no Ministério do Trabalho.
Como fazer a denúncia
É de suma importância contar tudo em detalhes e, se possível levar testemunhas, ou indicar o nome e endereço delas. Se a vida dos filhos/as e/ou familiares sofrerem qualquer tipo de ameaças e a pessoa sentir que está em perigo, ela pode também procurar ajuda em serviços que mantêm casas-abrigo, que são moradias em local secreto onde a mulher e os filhos podem ficar afastados do agressor.
De acordo com o crime especificado, a mulher pode necessitar ou não de um advogado para entrar com uma ação na Justiça. Caso não tenha dinheiro para tal, o estado poderá nomear um/a advogado/a para defendê-la. O que acontece em muitos casos é a retirada da queixa por parte da mulher, assim o caso não segue adiante.
Muitas vezes a mulher se arrepende e desiste de levar a ação adiante. Em outros casos, a mulher vai até o final do processo para colocar um ponto nesse passado de medo e terror, além de pedir indenização pelos prejuízos sofridos. Para isso, ela deve procurar a Promotoria de Direitos Constitucionais e Reparação de Danos.